CARBONO 14
Pensar a pedra
como atrás fora
o ser, é do chão.
A pedra que dentro
diz da criatura
seu peso-réu
de ambição. (De quem
o novo erro?)
Nosso verbo se iguala
ao dos dinossauros:
adubos de um paraíso além.
FÊNIX
Um corpo
para que o pó o plume
da pedra que o pena,
que pena
é peso de pálpebras
na palha após
do tempo.
A pena
que é do pássaro
o sempre depois
no próprio pó
a repetir-se.
O GOLPE
Deu-nos Deus a dádiva-dívida
do existirmos para a folha
de pagamento, indébita
quando pese em juros
o cunho do ser no chão
e cesse a cobrança.
CONTRACEPTIVO
É da noite
o colher galos
de sua infância.
Para a noite,
o experimento do dia.
A manhã final
previne-se da luz:
o galo in vitro
e o sol na gema.
LIÇÃO GASTRONÔMICA
À maneira dos peixes
no paladar dos mares,
as línguas do silêncio
nadam juntas no pó.
Ó cardápio em mim
onde sem pai naufrago:
és o que de Deus cabe
quando porto nenhum.
ESTOCAGEM
Um museu de sombras
gela em nosso sangue.
Pesamos sobre o engaste
do nada como um depósito
de sobras sem nenhum direito.
Detrás de que pálpebras
existiremos? Sob que
pensamento?
Qual pedra de nós
se fará sem risco?
EXERCÍCIO DE MONTARIA
O dia cavalga crepúsculos
em seus cavalos
Ó reino do estábulo,
a existência é esse relincho
sob os cascos gastos das horas.
OFÍCIO SOTURNO
Quanta carne
idêntica
usufrui o tempo.
Uma tabula rasa
sobre quem o solo
forja esquecimento.
Como de um AR-15
a última verdade:
em berço esplêndido
deita-se eternamente.
REFORMA AGRÁRIA
Repartir terras
no partir do ser
à terra que o dista,
a juntar-se ao ínfimo
grão sem flor dos ossos
da eternidade nele
debulhada em bulha.
Repartir terras
no ser adentro
como do bagre ao bago
se afogam na feira os peixes,
em frescos e podres:
o ser pode em bago
voltar ao que lhe é de terra
e de direito.
ALA OBSTÉTRICA
Sem centro ou cohab onde habite,
vivo a guitarrear teu sexo
como um pássaro hemorrágico.
Palavra de um só cadáver
para a selfie que é de dois
no céu inverso do umbigo.
Eternidade – este biombo
da garganta até o Hades
do vocábulo por dentro.
Eternidade – esta maca
no vazio a ser dos ossos
um deus nascendo da cloaca.
ENKIDU REVISITADO
Séculos de vitrais ganindo
sua chaga ambígua e recôndita;
séculos a arrojar de si
andrajos do orgânico aço
(O céu sucumbe sem mapa
quando da boca os animais
tornam navegável o abismo),
até que o vocábulo em trépano
rasgue os caibros da eternidade
no piscar de olhos de um morto.
NICODEMOS À NOITE
A água passa e resta a gente voltar ao Dia
em que as vacas espúrias flamejam nas pálpebras,
quando a perna suspende o azul no abrir do estábulo:
Morro! e resta em Deus o ganir dos eucaliptos.
INVENTÁRIO
Não tive ouro ou gado que me valha
neste pasto-imposto
cobrado à sanha de metralha.
(em vez de dólar dolo,
o duplo das vezes, fezes)
Não tive ouro ou gado que me valha
neste pasto feito excremento.
O silêncio atroz que me navalha
é tudo o que hoje ostento.
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